Companhia presente em 120 cidades aposta que oferta de serviços vai pagar a conta. Empresas como iFood e Magalu já embarcaram.
Aos 44 anos, Alexandre Frankel, fundador da Vitacon com o irmão Ariel Frankel e da Housi é empreendedor do setor imobiliário e tem o ramo nas veias. Só que vai bem além disso. Sempre gostou — e se dedicou — a pensar a cidade, a mobilidade e as tendências de futuro. E, junto com isso, trouxe muita inovação ao setor, como a tendência dos compactos e ultracompactos há mais de uma década. Viajou o Brasil falando do assunto: como melhorar a qualidade de vida das pessoas, com custo acessível de moradia e ainda ajudar a descarbonizar os grandes centros urbanos? Apartamentos menores e mais bem localizados eram a solução. O engajamento ajudou no sucesso da Housi, uma startup com apenas três anos de história e que neste ano deve alcançar R$ 100 milhões em receita e já com resultados positivos (desde meados do ano passado).
Os compactos que sempre defendeu, para que as pessoas pudessem morar perto do trabalho, atraiu críticas de empresários tradicionais do setor e foi tratado como um nicho pequeno no início, mas responde hoje por cerca de 70% dos lançamentos em São Paulo e agora está espalhado por diversas grandes cidades no país. Com 12 anos de existência, a Vitacon já lançou o equivalente a R$ 7,7 bilhões em valor geral de vendas (VGV), em imóveis, principalmente em unidades compactas. Por compacto, entende-se apartamentos abaixo de 40 metros quadrados.
Exatamente uma década atrás, Alexandre trouxe para um empreendimento na Vila Olímpia, bairro paulista berço da Vitacon, o arquiteto nova-iorquino Graham Hill especialista em móveis modulares e multifuncionais para decorar pequenos espaços. O lançamento da empresa era então o menor da cidade, com 19 metros quadrados. Mas esse nem entrou para a história como o definitivamente menor. Dois anos depois, vendeu em uma semana os apartamentos de dez metros quadrados, que aceitavam um carro como pagamento, de 10 metros quadrados no Bom Retiro, no coração da cidade de São Paulo.
Agora, novamente à frente de seu tempo, sonha com a moradia custo zero, em um modelo implementado pela Housi no qual a casa é o canal para consumo de toda sorte de produtos e serviços. “Por que você não paga para o usar o Instagram? Porque as empresas que querem te acessar como consumidor é que geram a receita. É a mesma lógica para a casa, no futuro.”
Outra bandeira de Alexandre, há mais de uma década, é a cultura do compartilhamento de bens e serviços — tudo, é claro, por meio da tecnologia. Quando a Quinto Andar ainda era uma ideia se organizando na cidade de Campinas, Frankel comprava a startup Sampa House, que queria gerir, mas com muitos serviços acoplados, o aluguel para quem adquiria uma unidade Vitacon pensando em renda com locação. O negócio não vingou, mas foi um embrião. “Inovar tem percalços. Tudo que fazemos hoje na Housi é derivado do que plantamos. Surfamos as mudanças do setor e de comportamento de tudo que implementamos lá atrás”, avalia ele, em entrevista à Revista EXAME.
Apesar da paixão pelos tijolos, o empresário sempre foi inconformado com os desafios de escala do setor. A atividade de construção e incorporação se provou um negócio regional, depois do fracasso retumbante das empresas que tentaram operar em nível nacional — a história da recuperação judicial da PDG Realty foi o símbolo maior do fim dessa ideia. Há quatro anos, Alexandre começou a falar, antes de passar o bastão da Vitacon para o irmão Ariel, que queria deixar o mundo dos ‘bricks’, tijolos, para se dedicar mais ao mundo dos ‘bits’, do mundo digital.
Agora, se dedica à Housi, que tem 300 empreendimentos na carteira, espalhados por 120 cidades do país, mas nenhum ativo no balanço. Quem constrói e incorpora são mais de 400 parceiros espalhados pelo Brasil. Alexandre coloca a marca e o software que opera o condomínio. A última novidade foi vender um empreendimento de uma incorporadora parceira, com a marca Housi, inteiro no metaverso. A companhia recebeu um único aporte de US$ 50 milhões, da gestora Redpoint eventures.
Embora no modelo atual, a Housi funcione diretamente em condomínios, não importando se quem mora é proprietário ou locatário, a expansão do negócio está diretamente relacionada à expectativa de expansão do mercado de aluguel no Brasil. Atualmente, do estoque nacional de 70 milhões de habitações, 21% são dedicadas à locação. Alexandre acredita que esse percentual está desatualizado e que haverá uma forte expansão do aluguel — um mercado bilionário ainda a ser melhor explorado. Nessa nova realidade, os serviços funcionam como grande diferencial e devem fazer com que surjam cada vez mais nichos especializados, como moradias estudantis, para quem tem pets, para o público maduro e muito outras tendências que sequer estão previstas.
Em 2020, a Housi chegou a tentar o IPO, o que mudou de lá para cá no negócio?
Alexandre Frankel: No pré-pandemia, a gente operava os compactos, pensando na gestão do aluguel, com serviços. Seríamos uma empresa de properties, com muitos ativos. Daí com a pandemia foi tudo a zero. Acabaram as viagens corporativas, acabou lazer, tudo. Ficou tudo parado. Tivemos que nos reinventar. Um empreendedor do Sul do país apareceu querendo colocar a Housi como a marca do prédio que iria incorporar. Até então, a gente não fazia isso. Mas o modelo deu super certo. Vendeu tudo em uma semana, em Porto Alegre, que é uma praça difícil. E aí não parou mais. Com isso, fazer a gestão do aluguel, que era a ideia original da Housi, se transformou em apenas mais uma das receitas, hoje com cerca de 12% do total. A gente embarca tudo para o incorporador. É como se os prédios antes fossem analógicos e agora se transformaram em digitais. Antes, só tinham uma portaria. E agora embarcamos tudo no condomínio, onde o morador pode fazer tudo por um aplicativo no celular e dentro do próprio prédio. Temos empresas gigantes agora que plugam as soluções nos empreendimentos: Rappi, iFood, Unilever, Pets, Magazine Luiza e muitas outras. Colocamos carro por assinatura, adega, mercado, água, serviços para pet, lavanderia, sistema de segurança, wi-fi, conexão, Netflix, carregador de carros elétricos e até cartório. Agora o prédio vai muito além do que só moradia.
Você se inspirou em alguma empresa lá fora?
Frankel: Sabe que não. Uma das grandes dificuldades que a gente enfrenta é explicar o que somos. Eu ‘sou’ o app residencial do Brasil. Não tem nenhum aplicativo, nenhuma empresa, que faça exatamente o que a gente faz. Por isso eu tento buscar inspiração em outros setores. E o mercado de software é o que chega mais perto. Você tem diversas fabricantes de celulares: Motorola, Samsung, Nokia e outros tantos. Mas eles precisam do sistema operacional Android para tornar aquele produto funcional. É isso que a Housi faz. Torna o condomínio operacional.
Então você é software da moradia?
Frankel: Eu diria que somos o sistema operacional. O que muda um pouco também é que construímos essa marca forte nacional. Em um ano bom do setor, o Brasil tem entre 300 e 350 mil unidades de lançamento. As empresas de capital aberto devem ter entre 30% e 40% desse total, somando todas. Ou seja, 70% é totalmente pulverizado. Os incorporadores pequenos e médios, que fazem dois prédios por ano, se tanto, não têm marca. Então eles usam o nome Housi. É algo como o Intel inside. Você pega um computador feito por um fabricante não tão conhecido e coloca uma garantia.
E o que mais vocês podem oferecer para o parceiro incorporador?
Frankel: Agora estamos partindo para ser uma fonte de escala e, indiretamente, de funding. O incorporador que for Housi já terá diversas preocupações solucionadas, tanto na estrutura do empreendimento, com energia limpa, como no uso de materiais. Entregamos isso pronto para eles. E isso já os qualificam para acessar linhas diferenciadas de financiamento porque tornamos os prédios mais sustentáveis. Os pequenos não conseguem ter essa estrutura ESG. Então, nós fornecemos as soluções e os modelos. Além disso, como especificamos os materiais, isso nos qualifica para negociar condições de compra muito melhores para esse incorporador. No ano que vem, por exemplo, já sabemos que seremos os maiores compradores de elevadores do Brasil, pelo volume de empreendimentos com a bandeira Housi que vão subir. Estamos fazendo uma espécie de compra coletiva. Vale para tudo que é replicável, como cerâmica, louças e metais. Estamos fazendo até materiais exclusivos Housi. A próxima fronteira é negociar com as grandes cimenteiras, fornecedores de aço. Por que não? É uma escala nacional que nenhuma construtora conseguiu. Pela primeira vez, esse benefício se torna acessível.
Mas, para o morador, todos esses serviços e comodidades que vocês colocam têm custo?
Frankel: Não. Ao contrário. O condomínio tem receita e fica mais barato. Assim como a Housi participa da receita de todas as transações com parceiros, uma parte reverbera para o condomínio. E o custo do investimento de adega, geladeiras, vendor machines, e tudo mais é da empresa parceira, que vende o produto ou serviço no prédio.
E qual a próxima fronteira da moradia?
Frankel: Meu sonho é a moradia custo zero. Tudo vai migrar para dentro da casa das pessoas. Haverá uma receita jamais imaginada de mídia, de consumo, de e-commerce e a moradia vai ficar com custo irrelevante. Então, ela vai ser infinitamente melhor, com mais serviços, e mais barata. A moradia será um meio. Obviamente tem muitos passos para chegar lá. Mas a visão é essa.
No modelo atual, a operação da Housi independe se os moradores dos condomínios são proprietários ou locatários. Há algum tempo, porém, você fala dos nichos específicos de mercado e de como o aluguel é cada vez mais uma tendência. Você ainda acredita nisso, até chegarmos à moradia de graça?
Frankel: Na Housi, os imóveis alugados respondem por 40%. E acredito muito no crescimento. Se a gente pegar, não o que está em estoque, mas o que está chegando no mercado, eu estimo que a locação já chegou em 30% e acredito que vai alcançar os 50% nos próximos dez a quinze anos. As pessoas ficam procurando explicação para essa mudança na taxa de juros, tentando adivinhar tendências de tipologia. Para mim, é puramente comportamental e filosófico. O motor é vontade de não imobilização. De liberdade. Não faz parte da concepção de vida do jovem. Ele não vê justificativa de se imobilizar financeiramente e fisicamente também. Não há nada que faça ele ver sentido em ficar ilíquido, endividado, pagando juros por 30 anos.
Mas como você vê o futuro: as grandes incorporadoras vão virar suas clientes ou vão partir para, cada vez mais, criar as próprias soluções?
Frankel: Elas podem tentar, mas não terão escala. As gigantes do setor fazem quantos empreendimentos por ano? De 20 a 30 prédios. É pouco para você agregar a indústria. Porque uma Magalu vai ter trabalho de falar e gerir algo desse tamanho? E hoje uma incorporadora não consegue ter o número de programadores que nós temos. São quase 100. Por isso entendo que o modelo é totalmente colaborativo e cooperativo. Cada um na sua especialidade. Um entende tudo de tijolo, engenharia, projeto, compra de terreno e aprovação. Ele não precisa entender de software. Já estamos com algumas grandes: Moura Dubeux, Tenda, Plano & Plano, tudo de modelo econômico. Esse é um desenho também que independe da faixa de renda. Temos hoje cerca de 100 empresas parceiras e mais de 200 soluções, que são totalmente flexíveis para se adaptar às necessidades do incorporador e do tipo de moradia.